Antes de tudo, um forte abraço, em amor à História e à Verdade...

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

ENTENDA OS MOTIVOS DA INDONÉSIA TER A PENA DE MORTE PARA TRÁFICO DE DROGAS


“Hukuman berta bagi pembana narkotik’’
É isso mesmo: punindo severamente o narcotráfico.

Togar Sianipar, chefe da agência antidrogas da Indonésia - Togar prometeu livrar a Indonésia das drogas até 2015, combatendo também a corrupção do sistema judicial – fechando o balcão de negócios a diplomatas e criminosos. Togar foi quem mandou pintar aquele aviso do hukuman em letras garrafais no aeroporto de Jacarta. Seu plano é simples e brutal: fuzilar os traficantes que pisarem no país.

#Indonésia tem as #penas mais duras para #tráfico_de_drogas do mundo, e não é à toa.

É efeito das #Guerras do #Ópio, e aí é que entram os #britânicos na história do brasileiro...
 
As Guerras do Ópio, ambas no século 19, são talvez o capítulo mais vergonhoso do imperialismo britânico.

A Inglaterra importava três produtos chineses em grande quantidade: seda, chá e porcelana. Os ingleses tinham um brutal déficit comercial com a China.

O que fazer?

A Inglaterra vivia a Revolução Industrial, e entendeu que poderia vender aos chineses uma série de quinquilharias.

Um navio inglês, comandado por um certo Lorde MacCartney, foi mandado para a China com os produtos destinados a equilibrar a balança comercial dos dois países.
O problema é que os chineses não se interessaram por nada.
Foi quando entrou em cena o ópio. A Inglaterra, berço da civilização, começou a contrabandear para a China, o ópio que produzia na Índia.

Foi um horror para a sociedade chinesa. São célebres as imagens de casas de ópio na China, em que as pessoas se consumiam num estado de letargia e alienação.

Obra dos ingleses
Letargia e Alienação: Obra dos Ingleses
Num certo momento, o governo chinês impôs leis duras para o contrabando de ópio. Antes, o imperador mandou uma carta à Rainha Vitória na qual ponderava que era injusto o que a Inglaterra fazia.
Da China, recebia porcelana, chá e seda. Em troca, cobria os chineses de ópio, proibido na Inglaterra.

A rainha, se leu a carta, não se manifestou.

Diante das dificuldades que surgiram para o contrabando, a Inglaterra decidiu fazer uma guerra, em meados dos anos 1 800.

O pretexto era que a China estava ferindo os princípios do livre comércio.

A China não teve como enfrentar as forças inglesas, adestradas nas guerras napoleônicas.

E o ópio foi imposto.

Batidos, os chineses não tiveram o que fazer. Armaram, depois, uma resistência, e as coisas apenas pioraram.

Veio a Segunda Guerra do Ópio, na qual a Inglaterra praticamente destruiu a China. Tomou territórios como Hong Kong e, suprema bofetada, colocou no comando da alfândega chinesa um inglês.
É simplesmente extraordinário que a China, devastada, tenha conseguido se reconstruir e ser o que é hoje.

Os estudiosos atribuem esse milagre ao confucionismo, a cultura de alto conteúdo de sabedoria prática que domina a China.
A única vitória – não pequena, aliás – da China foi ter conseguido dar o nome de Guerras do Ópio aos horrores praticados pelos britânicos em nome do livre comércio.

Perpetuou-se, assim, a vergonha.

Países ao redor da #China, como a ndonésia, foram duramente afetados pelas Guerras do Ópio. A Indonésia, no sudeste Asiático, era um dos portos de passagem para os navios ingleses abarrotados de ópio.
Como efeito colateral disso, a #população nativa sofreu pesadamente os #efeitos da droga

Os indonésios passaram a consumir ópio copiosamente.

As guerras passaram, mas o trauma ficou.

Na China, o tráfico de drogas é reprimido com penas 

severas. Na Indonésia, elas são ainda mais duras.

É dentro desse quadro que o brasileiro apanhado com cocaína está prestes a ser fuzilado.

Ele não poderia ter escolhido um lugar pior para contrabandear sua cocaína.

Na raiz das balas que deverão abatê-lo nos próximos dias, está o terror que o império britânico promoveu na Ásia no século XIX.http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-que-voce-deve.../


Por que um brasileiro vai ser fuzilado na Indonésia



Postado em 17 jan 2015
Foi vender droga no lugar errado
Foi vender droga no lugar errado
O brasileiro Marco Archer Cardoso Moreira, de 53 anos, de alguma forma vai morrer por culpa dos crimes do Império Britânico num passado já remoto.
Segundo informações do governo da Indonésia, ele vai enfrentar um pelotão de fuzilamento no próximo sábado.
Moreira foi condenado à morte em 2004, depois de ter sido apanhado com 13,4 quilos de cocaína ao tentar entrar na Indonésia. A droga estava escondida no interior de uma asa delta.
A título de curiosidade, aquilo é uma migalha diante da meia tonelada de pasta de cocaína descoberta no helicóptero dos Perrelas, mas isto é outra história.
A Indonésia tem as penas mais duras para tráfico de drogas do mundo, e não é à toa.
É efeito das Guerras do Ópio, e aí é que entram os britânicos na história do brasileiro prestes a ser fuzilado.
As Guerras do Ópio, ambas no século 19, são talvez o capítulo mais vergonhoso do imperialismo britânico.
A Inglaterra importava três produtos chineses em grande quantidade: seda, chá e porcelana. Os ingleses tinham um brutal déficit comercial com a China.
O que fazer?
A Inglaterra vivia a Revolução Industrial, e entendeu que poderia vender aos chineses uma série de quinquilharias. Um navio inglês, comandado por um certo Lorde MacCartney, foi mandado para a China com os produtos destinados a equilibrar a balança comercial dos dois países.
O problema é que os chineses não se interessaram por nada.
Foi quando entrou em cena o ópio. A Inglaterra, berço da civilização, começou a contrabandear para a China o ópio que produzia na Índia.
Foi um horror para a sociedade chinesa. São célebres as imagens de casas de ópio na China, em que as pessoas se consumiam num estado de letargia e alienação.
Obra dos ingleses
Obra dos ingleses
Num certo momento, o governo chinês impôs leis duras para o contrabando de ópio. Antes, o imperador mandou uma carta à Rainha Vitória na qual ponderava que era injusto o que a Inglaterra fazia.
Da China, recebia porcelana, chá e seda. Em troca, cobria os chineses de ópio, proibido na Inglaterra.
A rainha, se leu a carta, não se manifestou.
Diante das dificuldades que surgiram para o contrabando, a Inglaterra decidiu fazer uma guerra, em meados dos anos 1 800.
O pretexto era que a China estava ferindo os princípios do livre comércio.
A China não teve como enfrentar as forças inglesas, adestradas nas guerras napoleônicas.
E o ópio foi imposto.
Batidos, os chineses não tiveram o que fazer. Armaram, depois, uma resistência, e as coisas apenas pioraram.
Veio a Segunda Guerra do Ópio, na qual a Inglaterra praticamente destruiu a China. Tomou territórios como Hong Kong e, suprema bofetada, colocou no comando da alfândega chinesa um inglês.
É simplesmente extraordinário que a China, devastada, tenha conseguido se reconstruir e ser o que é hoje.
Os estudiosos atribuem esse milagre ao confucionismo, a cultura de alto conteúdo de sabedoria prática que domina a China.
A única vitória – não pequena, aliás – da China foi ter conseguido dar o nome de Guerras do Ópio aos horrores praticados pelos britânicos em nome do livre comércio.
Perpetuou-se, assim, a vergonha.
Países ao redor da China, como a Indonésia, foram duramente afetados pelas Guerras do Ópio. A Indonésia, no sudeste Asiático, era um dos portos de passagem para os navios ingleses abarrotados de ópio.
Como efeito colateral disso, a população nativa sofreu pesadamente os efeitos da droga. Os indonésios passaram a consumir ópio copiosamente.
As guerras passaram, mas o trauma ficou.
Na China, o tráfico de drogas é reprimido com penas severas. Na Indonésia, elas são ainda mais duras.
É dentro desse quadro que o brasileiro apanhado com cocaína está prestes a ser fuzilado.
Ele não poderia ter escolhido um lugar pior para contrabandear sua cocaína.
Na raiz das balas que deverão abatê-lo nos próximos dias, está o terror que o império britânico promoveu na Ásia no século XIX.
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Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

Renan Antunes: Dois brasileiros na balada da morte indonésia

publicado em 18 de janeiro de 2015 às 16:23

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Fotos de Marco Archer Cardoso Moreira e Rodrigo Muxfeldt Gularte feitas em 2005
Da Redação
Em 2005, o jornalista Renan Antunes de Oliveira, do jornal gaúcho  Já, foi a Jacarta, Indonésia, entrevistar os dois brasileiros condenados à morte naquele país por tráfico de drogas.  Durante quatro dias, ele conversou com o paranaense Rodrigo Muxfeldt Gularte e o carioca Marco Archer Cardoso Moreira.
Marco foi executado nesse sábado, 17 de janeiro de 2015. Rodrigo aguarda no corredor da morte.
Segue a íntegra da matéria publicada publicada em 2005, no Jornal Já.
Na balada da morte
RENAN ANTUNES DE OLIVEIRA | ENVIADO ESPECIAL DO JORNAL JÁ A JACARTA |
Entrevistas exclusivas na cadeia com os brasileiros condenados à morte na Indonésia
Ainda não caiu a ficha do paranaense Rodrigo Muxfeldt Gularte, 32 anos, nem a do carioca Marco Archer Cardoso Moreira, 43, os dois brasileiros condenados à morte na Indonésia por tráfico de cocaína. Na quinta-feira 17, Marco perdeu o último apelo à Suprema Corte, dependendo agora de um improvável perdão presidencial para ser beneficiado com prisão perpétua. Na segunda 21 o presidente Lula pediu ao seu colega indonésio clemência em favor do condenado.
Durante quatro dias de entrevistas na cadeia de Tangerang, entre a quarta-feira 9 e o sábado 12, eles deram muitas gargalhadas relembrando suas aventuras. Os dois não estavam nem aí para a possibilidade de enfrentar o Criador, via pelotão de fuzilamento, ou passar o resto de suas vidas presos nos cafundós da Ásia. Se sentem como se tudo fosse apenas uma bad trip.
Eles confessaram ser traficantes tarimbados. E demonstraram, sim, algum arrependimento, mas só por ter embalado mal a droga que levavam em seus equipamentos esportivos, permitindo a descoberta pela polícia. Ela pegou Rodrigo com seis quilos escondidos em suas pranchas de surf, em 2004. E Marco com 15 na sua asa delta, em 2003.
Os dois homens que hoje dividem a mesma cadeia chegaram lá por trajetórias diferentes no mundo das drogas. Rodrigo foi mais usuário do que traficante, começou cheirando solvente aos 13 anos. Marco entrou no tráfico aos 17, já no topo da pirâmide, diretamente com os cartéis colombianos. Ambos fizeram várias viagens bem-sucedidas para muitos países, antes de se danarem no aeroporto da capital Jacarta, portão de entrada para se chegar na ilha de Bali, o paraíso dos pirados.
Os dois faziam parte de gangues diferentes. Na cadeia, formaram um laço instantâneo. Ficaram amigos ao ponto de dividir prato e colher. Suas afinidades: não terminaram os estudos, jamais trabalharam, sempre foram sustentados por outros, exploraram as famílias, viveram só pras baladas.
PROTEÇÃO MATERNA
As mães deles – mulheres sofridas, esperançosas e guerreiras – estão em campanha pela liberdade dos “garotos”, como elas e parte da imprensa tratam os dois barbados. Depois de gastarem os tubos com eles, estão raspando os cofres para resgatá-los. Na falta de uma boa causa além do incondicional amor de mãe, usam a bandeira do repúdio à pena de morte, de forte apelo na fatia esclarecida da humanidade.
Dona Clarisse, de Rodrigo, mobiliza o Itamaraty para proteger o seu. Dona Carolina, de Marco, obteve da Câmara de Deputados o envio de um apelo de clemência ao parlamento indonésio. A proposta, do deputado Fernando Gabeira, foi aprovada em plenário com apenas um voto contra, do deputado Jair Bolsonaro, um ex-militar linha-dura que há décadas luta pela adoção da pena de morte no Brasil.
Os diplomatas brasileiros em Jacarta trabalham nos bastidores para reverter as sentenças. Estão confiantes que vai dar certo. Notam a moleza do sistema porque só um traficante foi executado até hoje, dos 30 condenados sob as duras leis antidrogas indonésias de 2000. Era um indiano pobretão.
Pela expectativa otimista deles será possível reduzir a pena de Rodrigo para prisão perpétua, em segunda instância, negociando em dinheiro uma redução maior ainda na terceira, para 20 anos, com soltura em sete, talvez 10 – é sabido que o Judiciário indonésio adota uma regra não-escrita de trocar tempo de encarceramento por uma pena pecuniária.
Eles admitem que no caso de Marco, já sentenciado em última instância, vai ser mais difícil. Será preciso om perdão presidencial apenas para reduzir de pena de morte para prisão perpétua, e depois negociar a saída. É que ele se tornou uma causa célebre porque fugiu do aeroporto quando foi descoberto com a droga, protagonizando uma caçada policial acompanhada em rede nacional de tevê.
Os custos para dar jeitinho nas sentenças e as despesas para manter os dois em celas cinco estrelas podem chegar a quase 200 mil dólares por cabeça. Dona Clarisse tem até mais para salvar Rodrigo; dona Carolina anda passando o chapéu. O desenrosco deve ser demorado: na melhor das hipóteses seus garotos voltariam pra casa entrados em anos, um quarentão, outro cinquentão.
Agora o quadro sinistro: o fuzilamento do indiano pobretão, ocorrido em fevereiro, sinaliza uma mudança perigosa para os sonhos de liberdade dos brasileiros – a de que só dinheiro já não adianta mais.
É que a execução saiu por insistência do general durão Togar Sianipar, chefe da agência antidrogas deles. O homem está ‘‘hukuman berta bagi pembana narkotik’’. É isso mesmo: punindo severamente o narcotráfico.
Togar prometeu livrar a Indonésia das drogas até 2015, combatendo também a corrupção do sistema judicial – fechando o balcão de negócios a diplomatas e criminosos. Togar foi quem mandou pintar aquele aviso do hukuman em letras garrafais no aeroporto de Jacarta. Seu plano é simples e brutal: fuzilar os traficantes que pisarem no país.
“MORTE AOS CRISTÃOS”
O povão muçulmano o apóia. No tribunal, durante o primeiro julgamento de Rodrigo, em fevereiro, a platéia pedia ‘‘morte aos traficantes ocidentais cristãos’’, descrição na qual se encaixam os dois brasucas. O pedido da massa deixa o governo firme para rejeitar as campanhas internacionais por direitos humanos, livre de dúvidas existenciais sobre a pena de morte.
O modelo prende e mata já deu certo na política, em 1965, quando o país se dividia entre esquerda e direita. Em quatro meses, o presidente-general Suharto implantou o capitalismo fuzilando quase um milhão de comunistas.
Esta tradição não parece assustar os brasileiros sentenciados ao fuzilamento. Nos momentos de maior delírio eles já se enxergam, Marco em Ipanema e Rodrigo nas praias de Floripa, contando aos amigos como se livraram da fria.
Rodrigo sonha que políticos influentes amigos da mãe vão pressionar Lula para que ele interceda oficialmente a seu favor, pedindo clemência ao presidente indonésio. Marco anda tão avoado que até já encomendou de Casemiro, um amigo no Rio, o último modelo de asa-delta.
Paradoxalmente, a prisão é o momento de glória de suas vidas: “Somos os únicos entre 180 milhões de brasileiros”, diz Rodrigo, deslumbrado com a notoriedade obtida com o narcotráfico – cujo pico de audiência é entre jovens ricos praticantes de esportes radicais.
Eles acreditam nas chances de transformar o limão numa limonada. Estão com tudo pronto para botar um diário na internet. Planejam contratar videomakers para acompanhar seus dias. Negociam exclusividade na cobertura jornalística, começaram a escrever livros com a experiência.
Uma benção para os planos de libertação foi o tsunami que arrasou uma zona pobre da Indonésia: familiares e diplomatas contabilizam cada avião brasileiro de ajuda humanitária como um ponto para a futura negociação. O Itamaraty espera que os indonésios considerem isso na hora de analisar o pedido de clemência feito por Lula.
MORDOMIA NA PRISÃO
Enquanto esperam, os dois compram privilégios para viver como marajás na cadeia – ambos estão com o cordão umbilical ligado nas contas bancárias das mães: “Aqui é como numa pousada, muito legal, só que jogaram a chave fora”, diz Rodrigo, satisfeito, mesmo sendo acostumado ao conforto de sua suíte com sauna, na casa da família, em Curitiba. Marco também não resmunga, mas sente saudades dos apês na Holanda, EUA e Bali.
Enquanto os 1300 presos muçulmanos estão amontoados em 10 por jaula, cada um dos brasileiros tem sua cela. E elas estão equipadas com TV, ventilador, geladeira, forno elétrico, som pauleira. No jardim privativo criam pássaros, podam bonsais, alimentam os peixes do laguinho, cuidam da gata Tigrinha.
O serviço é excelente: presos pobres fazem a faxina, lavam as roupas deles, são garçons nas festas, cabeleireiros, pedicures. Os dois podem receber gente sem formalidades, todos os dias. Rodrigo já foi visitado pela família, pela namorada, a empresária carioca Adriana Andrade, e pelo parceirão Dimitri “Dimi” Papageorgiou.
Dimi é outro garotão com mais de 30, carioca de pais gregos, acusado de ser líder da quadrilha contratante do malfadado transporte das pranchas recheadas de coca. Apareceu na cadeia para ver seu mula Rodrigo, deu 2 milhões de rúpias para ele se virar, dinheirama que vale só 500 pilas. Mas agora Dimi não vai mais poder ajudar: ele foi preso, em fevereiro, pela Polícia Federal, no Brasil – aquelas rúpias dadas a Rodrigo poderão lhe fazer falta.
Marco recebeu a visita de amigos de Bali e de uma senhorita conhecida apenas como ‘Dragão de Komodo’, sua namorada indonésia. A moça também é sentenciada, está na área feminina da prisão. Dona Carolina já esteve com ele duas vezes, a última no niver, em outubro, quando deu uma festinha com brigadeiros e refris – depois, tirou uma soneca na cela do filho.
Dona ‘Carola’ é funcionária pública aposentada, superdescolada. Conquistou a simpatia dos carcereiros de Marco com seu ‘show do milhão’. Foi assim: cansada do assédio deles por dinheiro para cigarros, ela trocou 1 milhão de rúpias em notas de 10 mil (quase R$2,50) e saiu pelo pátio jogando as cédulas para o alto. Guardas e presos lutaram para recolher a mixaria.
Mais showtime na cadeia: os dois recebem suas visitas íntimas no sofá da sala do comandante. De vez em quando pinta um ecstasy. E nas noites quentes rola até um chopinho gelado, cortesia de um chefão local, preso no mesmo pavilhão. Lá, a balada não pára nunca.
A comida é tudo de bom. Marco tem curso de chef na Suíça, dá show na cozinha. Na semana passada seu cardápio incluía salmão, arroz à piemontesa, leite achocolatado com castanhas para sobremesa. O fornecedor dos alimentos é Dênis, um ex-preso tornado amigão. Ele pega a lista por celular e traz tudo fresco do Hypermart.
Quando o amigão está ocupado e a geladeira vazia, Marco chama a cobrar a mãe no Rio, que liga pra mãe de Rodrigo em Curitiba, que aciona a Embaixada, que despacha um chofer pra garantir o fome zero da dupla.
Como Tangerang é uma prisão provisória, nos arredores de Jacarta, Rodrigo e Marco estão como naquela piada da hora do recreio no inferno. O secretário do diabo pode anunciar o fim dos privilégios a qualquer momento. Pior do que o fogo será a transferência deles para o Carandiruzão de uma remota ilha no Sul, onde serão misturados com 10 mil presos muçulmanos: aí será bom começarem a rezar para Alá.
Sempre otimistas, já têm planos para tentar se refazer lá embaixo. Rodrigo bola um jeito de demonstrar sua habilidade em pesca submarina, para presentear peixes ao comandante da nova cadeia e conquistar sua amizade.
Difícil saber como é que lhe ocorreu uma ideia destas. Mas é fazendo planos absurdos como esse que eles passam os dias. As baladas da cadeia, o papo encorajador das famílias, o apoio dos diplomatas e a expectativa de que suas ações possam ficar impunes dão um tom surrealista pra todas conversas deles.
Num papo, Rodrigo revela sua crescente admiração pelo companheiro, já o acha até injustiçado. “Marco teve uma vida que merece ser filmada”, exalta, contando ter oferecido um roteiro sobre o amigo à cineasta curitibana Laurinha Dalcanale. “Ele fez coisas extraordinárias, incríveis.”
O repórter pede um exemplo de tal obra. “Ué, viajou pelo mundo todo, teve um monte de mulheres, foi nos lugares mais finos, comeu nos melhores restaurantes, tudo só no glamour, nunca usou uma arma, o cara é demais.”
Menos, Rodrigo. Menos.
Ele pára alguns segundos, reflete um pouco. Sai devagar do deslumbramento com as vantagens do narcotráfico sobre um emprego comum. Muda o tom e pede ajuda: “Por favor, brother, quando você for escrever, dê uma força, passe uma imagem positiva nossa, pra ajudar na campanha”.
Então diga lá o que você vai fazer quando for solto: “Bota aí que eu quero trabalhar 10 anos pro governo dando palestras pra crianças sobre a roubada que é o tráfico”.
Ele diz e saboreia o efeito das palavras. Traga seu Marlboro, acaricia Tigrinha. Parece sério, joga a fumaça pra cima. Quando solta tudo, o corpo já está se chacoalhando. É que ele não conseguiu conter o riso.
“Vou sair dessa”
SEU ÚLTIMO DESEJO: VOAR MAIS UMA VEZ EM SÃO CONRADO
Marco Archer já esperava ter a pena de morte confirmada no Supremo Tribunal indonésio, como ocorreu na quinta 17. Sua única esperança agora é um apelo do Itamaraty ao presidente indonésio por clemência. Isto lhe pouparia a vida, mas o deixaria para sempre na cadeia. A execução ainda pode demorar cinco anos.
Quem é Marco? Um carioca, com o apelido chinfrim de Curumim. Ele cresceu classe média na Ipanema dos ricos. Queria ser um deles. Em 80, aos 17 anos, foi à Colômbia disputar um campeonato de asa delta. Voltou campeão, mas mordido pela mosca azul do narcotráfico: sacou como ganhar dinheiro fácil.
“Alguém no hotel me deu uma caixa de fósforos com cocaína. Depois da primeira viagem, nunca fiz outra coisa na vida, tenho mais de mil gols”, exagera.
Ele conta que serviu de mula no Hawai, Nova York, Europa toda. “Fazia viagens rentáveis, ficava meses sem trabalhar.”
Na cadeia, Marco passa horas olhando fotos amassadas que guarda numa imunda pasta preta. São recuerdos de suas viagens, de belas mulheres, de carrões e barcos: “Não posso me queixar da vida que levei”.
Orgulha-se: “Nunca declarei imposto de renda, nem tive talão de cheque, não servi ao Exército. Só votei uma vez na vida. Foi no Collor, amigo da família”.
Com o dinheiro do tráfico, Curumim manteve apartamentos em três continentes, abertos pra patota da asa delta, do surf, da vida boa: “Nunca perguntaram de onde vinha meu dinheiro”.
Marco conta que saiu do Brasil para morar em Bali há 15 anos, “cansado de ver meu irmão (Sérgio) bater na minha mãe para obter dela dinheiro pras drogas”. O irmão morreu de overdose em 2000, mas a estas todas ele tinha tido seu infortúnio: em 1997 caiu da asa, sofreu várias fraturas.
Dali pra frente sua atividade de mula de drogas diminuiu, as contas de hospitais cresceram. Ficou quase dois anos sem andar, até conseguir se recuperar. Hoje anda com dificuldades, com as pernas cheias de pinos de metal.
Pra decolar outra vez na vida boa ele preparou aquele que seria seu último golpe, faturar 3 milhões e 500 mil dólares inundando Bali com cocaína.
Foi ao Peru, pegou 15 quilos com um fornecedor, por uma bagatela, cerca de 8 mil dólares o quilos (dinheiro que ele obteve com um chefão americano, com quem dividiria os lucros da operação).
Marco meteu a droga nos tubos de sua asa delta. Saiu de Iquitos, no Peru, para Manaus, pelos rios da Amazônia. “Eu me misturei com turistas americanos e nunca fui revistado”, gaba-se. De lá embarcou para Jacarta: “Tava tudo pronto pra ser a viagem da minha vida”.
No desembarque, mete o equipamento no raio x. A asa de Marco tinha cinco tubos, três de alumínio e dois de carbono. Este é mais rijo e impermeável aos raios: “Meu mundo caiu por causa de um guardinha desgraçado”.
Como foi: “O cara perguntou porque a foto do tubo saía preta. Eu respondi que era da natureza do carbono. Aí ele puxou um canivete, bateu no alumínio, fez tim tim, bateu no carbono, fez tom tom”.
O som revelou que o tubo estava carregado. Foi o fim de uma bem-sucedida carreira de 25 anos no narcotráfico.
Marco ainda conseguiu dar um desdobre nos guardas. Enquanto buscavam as ferramentas, ele se esgueirou para fora do aeroporto, pegou um prosaico táxi e sumiu – ajudado pelo fato de falar fluentemente a língua bahasa.
Estava com tudo pronto para escapar no iate de um amigo milionário, mas aí azar pouco é bobagem. Um passaporte frio que ele tinha foi queimado por um cúmplice que também fugia da polícia.
Depois de 15 dias pulando de ilha em ilha no arquipélago indonésio – estava tentando chegar ao Timor do Leste –, passou sua última noite em liberdade num barraco de pescador, em Lombok.
Acordou cercado por um esquadrão policial, armas apontadas. Suplicou em bahasa, tiveram misericórdia dele.
Na cadeia esperando a execução, procura levar seus dias na malandragem carioca, na maior paz com os carcereiros, sempre fazendo piadas, cozinhando-lhes pratos especiais.
Acabou pro Curumim? “Vou fazer tudo para continuar vivo e sair dessa”.
NAS DROGAS DESDE OS TREZE
Rodrigo nasceu em Foz do Iguaçu. É neto de latifundiário produtor de soja, filho de mãe milionária, dona Clarisse. O pai é um médico gaúcho de Santana do Livramento, Rubens Borges Gularte.
Aos 13, já em Curitiba, Rodrigo começa nas drogas, cheirando solventes. “Era um garoto maravilhoso, a alegria da família, nunca levantou a voz”, isso é tudo o que a mãe lembra dele naquela época.
Com 18 é preso fumando baseado no parque Barigüi. O pai queria deixar que ele fosse processado. A mãe não concorda, suborna um delegado com mil dólares pra soltar o garoto: “Se fossem prender todos que fumam”, justificou dona Clarisse.
O garoto ganha seu primeiro carro. Bota amigos dentro e sai pela América Latina como um Che Guevara mauricinho, bebendo e se drogando. “Fiz cada loucura”, lembra.
Aos 20 Rodrigo era um rapaz de 1,84m, magrão, modos educados, cheio de namoradas. Teve um breve romance com a professora catarinense Maria do Rocio, 13 anos mais velha, fazendo Jimmy, hoje com 12, autista. Raramente via o filho: “Eu não estava preparado para a paternidade”, admite.
Rodrigo passa a viajar muito e pira total: “Em Marrocos, fumei o melhor haxixe”. No Peru: “Coca da pura”. Na Holanda: “Ecstasy de primeira”.
Aos 24, sai bêbado e drogado de uma festa. Bate o carro num táxi, tenta fugir, bate noutro, abandona tudo e corre pra casa da mãe. Ela dá uma volta na polícia, chama um médico, interna o garoto.
Na ficha de internação, o médico João Carlos anota: “Mostrou onipotência, estava depressivo”.
Nos anos seguintes a mãe fez de tudo para ele dar certo. Abre para Rodrigo uma creperia, em Curitiba. Não deu. Uma casa de massas, em Floripa. Não deu. Mandou pra fazenda. Não deu. Rodrigo vai estudar no Paraguai. Não deu. Ele se matricula na UFSC. Não deu.
Rodrigo começa no tráfico: “Fiz várias viagens à Europa só para trazer skunk”, confessa.
“Se ele fazia isso, não sei onde metia o dinheiro, porque nunca tinha um tostão”, rebate a mãe.
A prisão: “Os carinhas me deram as pranchas com cocaína dentro. Embarquei em Curitiba, onde o raio x é ruim, pra desembarcar em Jacarta”.
O NARCO TAMBÉM NÃO DEU CERTO
Agora ele se lamenta: “Só depois soube que os japoneses doaram um raio x potente pros indonésios, eles pegaram a droga”.
Rodrigo filosofa: “Meu erro foi a coca. O skunk é energia positiva, o ecstasy dá um barato legal, mas a cocaína é do mal”.
Um desabafo: “Se a parada tivesse dado certo eu estaria surfando em Bali, cercado de mulheres”.
Seu futuro: esperar as negociações do Itamaraty e tentar reduzir a pena em segunda instância.
Uma novidade: ele está namorando firme. Com uma menina indonésia, caixa de um supermercado, prima de um condenado. Ela entrou para visitar o parente, os dois se pegaram no olhar. Ele foi no primo, soltou um plá, consegui atrair a menina.
Ela vem uma vez por semana, Rodrigo dá uns amassos nela, na sala do comandante.
 Leia também:
http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/renan-antunes-de-oliveira-na-balada-da-morte-na-indonesia.html



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